Uma marquinha branca na testa, cerdas abundantes e escuras e um jeito dócil de ser. Essas são as características que diferenciam os porcos moura entre os suínos. Para preservar a linhagem, o Projeto Porco Moura da Universidade Estadual de Ponta Grossa trabalha com ensino, pesquisa e extensão. Na última quarta-feira (14), professores e alunos comemoraram os dez anos de atividades, com palestras, encontro com produtores e dia de campo na Fazenda Escola Capão de Onça (Fescon).
A professora do Departamento de Zootecnia, Maria Marta Loddi, é quem coordena os trabalhos desde o início. Para ela, é uma emoção comemorar uma década de trabalhos com foco na conservação da raça moura. “Um sentimento de gratidão muito grande por todo esse caminho trilhado ao longo desses 10 anos”, conta, emocionada. Tudo começou com o trabalho de mapear raças suínas nativas do Paraná, junto ao Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (Iapar), como ela recorda. “Neste trabalho pelos Campos Gerais, a raça moura teve uma predileção, então fizemos este resgate em algumas propriedades, para ver o histórico”, relata.
Com as pesquisas, o grupo percebeu o potencial produtivo dos porcos moura. “Então, pensamos em formas de conservar esse material genético e trazer o trabalho aqui para a UEPG e fazer um trabalho mais científico”, destaca Loddi. À época, a raça moura estava ameaçada de extinção. Com o trabalho realizado pela UEPG e demais instituições públicas, atualmente são mais de 200 produtores nos estados da região Sul. Os que têm criações são chamados de “guardiões da raça”, de acordo com a professora. “Aqui, nós também somos uma instituição guardiã. No começo, trabalhávamos com o resgate, e agora preservamos, fazendo padronização e conservação desse rebanho junto aos produtores”.
A conservação acontece por meio do estudo do material genético. A aluna do curso de Zootecnia Nicoly Rafaelly Sovinski é uma das integrantes que pesquisa com este objetivo. “Para a gente ter essa confiabilidade de que o porco seja realmente da raça moura, fazemos medidas métricas, analisamos a coloração, as mucosas dos olhos, medimos o nariz, orelhas e patas. Assim, garantimos que essa genética passará pra frente e, com isso, vai se perpetuando a raça”. Os estudos são com a criação que fica em uma estação de tratamento na Fazenda Escola, gerido pelo projeto e pelo curso de Zootecnia. Nicoly não nega que se apaixonou pela pesquisa conhecendo os porcos. “Eu achei incrível por ser uma raça nacional, por a gente ter ela tão perto aqui no Paraná”.
Características
O porco moura é conhecido por ser altamente resistente e começou a se popularizar na época das tropeadas, no século XX. “As criações vinham lá do Rio Grande do Sul para serem vendidas em Sorocaba. Então são animais altamente resistentes, porque eles tinham que fazer essa longa caminhada e estarem saudáveis para a venda”. A raça foi importante no Ciclo da Banha, na década de 1950, período em que a gordura de porco era o principal elemento para preservar alimentos e ser base para velas e lamparinas. Com a instalação de fábricas de óleo vegetal e foco na carne no lugar da banha, os porcos foram perdendo o potencial comercial.
“Por isso, hoje, o porco moura é muito característico da agricultura familiar, de pequenos e médios produtores. Eles são criados mais ao ar livre, e por isso a dificuldade em fazer em grande escala”, detalha Maria Marta. Ao contrário da raça suína industrial, a moura tem uma alimentação mais variada, como ração, frutas, tubérculos, verduras, legumes e sementes. “Isso dá essa característica de uma carne diferenciada, chamada marmoreio (gordura intramuscular na carne)”, de acordo com a professora. A carne do porco moura tem coloração vermelho intenso, que lembra cortes bovinos de maior qualidade.
Apoio a produtores
Em 2024, o Paraná considerou a raça como Patrimônio Histórico, Cultural e Genético, por meio da Lei 22.197/24, chamada de “Lei do Porco Moura”, que ainda instaurou a Semana Estadual de Porcos Crioulos. “Agora está vindo uma regulamentação da nossa Agência de Defesa Agropecuária, pra gente caracterizar e poder comercializar a raça como um todo. Então houve uma evolução das nossas demandas, ao longo desses anos, no desenvolvimento de pesquisas e auxiliando os produtores”, conta Maria Marta.
Um desses produtores é Herculano Lisboa, que cria há mais de 15 anos porcos moura em Prudentópolis. Ele participou do evento organizado no dia 14. “Já adquiri algumas matrizes da raça aqui na Universidade, e ficamos felizes com esse projeto, porque é um resgate da raça. Os porcos moura são a nossa paixão, e nesses eventos nós sempre aprendemos muito”.
Ter o porco moura na UEPG faz com que os alunos conheçam outros sistemas de criação de suínos, já que estes são mantidos mais ao ar livre. Como explica o acadêmico João Vitor Machado, a raça se adapta bem em ambientes rústicos. “Ele precisa desses espaços para expressar a personalidade mais tranquila, porque ele gosta de viver em bando. São animais bem curiosos, gostam de fuçar e de cavucar”. João conta que não conhecia a raça até entrar no curso de Zootecnia. “Quando me formar, quero ter uma criação própria e também seguir trabalhando com isso na pesquisa”.
Para Maria Marta, o trabalho dos acadêmicos tem sido fundamental para a conservação genética dos animais na UEPG. “Estamos aliando a conservação, junto aos produtores, e a genotipagem, com pesquisas, então são várias pontes que atravessamos e que ainda vamos atravessar”, finaliza.
Texto: Jéssica Natal | Fotos: Jéssica Natal, Kauã Souza
Divulgação/UEPG